AÇÃO CIVIL PÚBLICA DO MPPE PEDINDO NULIDADE DA LEI MUNICIPAL 4.505/2018 - GARANHUNS


EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE GARANHUNSESTADO DE PERNAMBUCO






O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO, por seu representante infra-assinado, pela curadoria de Meio Ambiente e Urbanismo, legitimado pelo artigo 129, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Lei n°8.625 de 1988, Lei Complementar n°12atualizada pela Lei Complementar n°21, vem até Vossa Excelência, na forma da Lei n°7.347 de 1985, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO C/C PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA CAUTELAR
em face de:

1)    MUNICÍPIO DE GARANHUNS, pessoa jurídica de direito público interno, com sede na Avenida Santo Antônio, 126, centronesta cidade de Garanhuns/PE -  representado por seu atual prefeito, o senhor Izaías Régis Neto, ou seu procurador;
2)    Câmara Municipal de Garanhuns, representada por sua Presidente Carla Patrícia Gomes de Oliveira - Carla de Zé de Vilaço, com endereço na Câmara Municipal de Garanhuns;
3)    VIANA E MOURA Construções SA, pessoa jurídica de direito privado, CNPJ nº 02.737.577/0001-06, com endereço na Avenida Domingos Ferreira, 2160, loja 01, Boa Viagem, Recife/PE, CEP 51111-020;
4)             IZAÍAS RÉGIS NETO, prefeito de Garanhuns, empresário, nascido em 13/11/1954, branco, casado, natural de Terezinha-PE, ensino médio completo, CPF 173.909.664-91, com endereço no Palácio Celso Galvão, Av. Santo Antônio, 126 – Santo Antônio, Garanhuns, CEP: 55293-904. pelos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos:



DOS FATOS

Consoante nos informam as anexas provas, no dia 23 de novembro de 2018, com publicação no Diário Oficial dos Municípios do Estado de Pernambuco no dia 27 de novembro de 2018 (sem constar a publicação dos anexos da Lei), foi promulgada, pelo prefeito demandado, a Lei nº 4.505/2018, de iniciativa do mesmo demandado, dispondo sobre criação de 04 Núcleos urbanos inseridos em área Rural no Município de Garanhuns, após o respectivo projeto de lei tramitar sob o regime de “urgência urgentíssima” (artigo 97 do Regimento Interno na Câmara Municipal), conforme informação de membros da Casa em reunião ministerial de 03/12.
Evidencia-se pelo teor da própria Lei, seus anexos (anexos não publicados, diga-se de passagem) e demais documentos anexos, que a Lei Municipal foi proposta com o objetivo de “criar a possibilidade de regularização de parcelamento com destinação urbana”, pretendendo “regularizar” empreendimentos da Construtora demandada, que tem, no local diretamente afetado pela Lei, empreendimento imobiliário já construído (Conjunto São Vicente 1) e projeto de novo empreendimento (Conjunto São Vicente 2).
Na referida Lei são apontadas, detalhadas e identificadas as áreas rurais que sofrem mudança para núcleos urbanos, com expressão de que esses núcleos urbanos terão seu zoneamento caracterizado como Zona de Alta Densidade – ZAD, “respeitando-se todas as características assentadas no Plano Diretor Participativo deste Município – Lei nº 3.620/2008” (sic).
Ocorre que - sem adentrarmos neste momento no mérito dos empreendimentos referidos - a referida Lei padece de nulidade formal, em decorrência de vícios insanáveis na sua tramitação:
1. viola os princípios da publicidade e da transparência, pois a explicação que o Município tem dado à população sobre a referida Lei contradiz-se com o conteúdo da própria Lei: em reunião ministerial, através de sua secretaria de planejamento, o Município informou que com a Lei estava reclassificando área que seria de Zona de Transição – ZT (artigo 55 do Plano Diretor), passando a classificá-la como Zona de Alta Densidade – ZAD, quando se verifica no teor da Lei que, na verdade, o Município está pretendendo criar quatro núcleos urbanos inseridos em zona rural, passando-os diretamente para ZAD, sem qualquer transição;
2) a Lei citada viola frontalmente o princípio participativo, que orienta o Plano Diretor, suas alterações e revisões -, pois tal Lei altera o Plano Diretor do Município de Garanhuns, ampliando a zona urbana e reconfigurando o zoneamento, sem, contudo, as necessárias e antecipadas discussões com a sociedade civil – através de audiência pública, oitiva da população local diretamente envolvida - e consulta a órgão fundamental na área: o conselho municipal do meio ambiente; ao contrário, ilicitamente, apresenta o referido projeto de lei em regime de “urgência urgentíssima”.
Conforme se extrai da Ata de Reunião promovida por esta Promotoria no dia 03 de dezembro de 2018, na sede da Escola Abílio Camilo Valença, na região afetada, a comunidade foi ouvida, denunciando que tanto no âmbito do Executivo quanto do Legislativo municipal, o projeto não foi submetido à consulta da população e sequer foi disponibilizada a realização de audiências públicas, o que foi confirmado inclusive por membro da Câmara de Vereadores.
Para além disso, durante a tramitação do Projeto de Lei, sequer foi ouvido o Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente – CODEMA, órgão diretamente interessado, como informa o próprio CODEMA no ofício 25/2018 e em atas de reunião do órgão ambiental, destacando-se que não lhe foram apresentados os projetos que redundaram na referida Lei nem quaisquer estudos técnicos que justificassem a alteração, tais como: Estudo de Impacto Ambiental (EIA), Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), Relatório Ambiental Simplificado (RAS), Estudos de Caracterização das Áreas, Cadastro Ambiental Rural das propriedades, Estudo de Viabilidade Econômica e Ambiental.
Mesmo assim, a Lei foi aprovada pela Câmara Municipal e promulgada pelo Poder Executivo – demonstrando-se clara a ilegalidade de sua tramitação, o que, no entender deste órgão ministerial, a torna natimorta.
Apesar da manifesta nulidade, a população de Garanhuns está sujeita aos efeitos concretos de tal Lei, com todas os prejuízos ambientais e urbanísticos que podem advir de sua implantação açodada, sem as cautelas indispensáveis para a proteção das gerações atuais e futuras.
Por tal razão, necessário que se declare a nulidade da Lei nº 4.505/2018, , eis que ele está eivada de ilegalidade por vício insanável na tramitação, como explicitado e adiante endossamos, sendo urgente, por cautela e risco de danos irreparáveis ou de difícil reparação, que se suspenda qualquer ato com base na referida Lei.

DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

A Lei nº 4505/2018, que altera e viola o Plano Diretor de Garanhuns, Lei nº 3620/2018, sendo de efeitos concretos, transmuta-se num ato administrativo e revela-se incompatível com os artigos 24, I, e 29, XII da Constituição da República que disciplinam a legislação concorrente de Direito Urbanístico e preveem a participação popular no processo de gestão municipal.
O Estatuto da Cidade estabelece que o processo de elaboração, ou de revisão, de Plano Diretor e legislação correlata deve ocorrer com a ampla participação popular, através dos seguintes instrumentos:
Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.
(...)
§ 4o  No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:
I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;
II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;
III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.

A Doutrina e a Jurisprudência brasileiras já vêm consagrando a interpretação de que tais dispositivos tornam inconstitucional, e por isso mesmo nula, qualquer lei municipal de Plano Diretor, ou zoneamento, elaborada sem a participação popular. Exemplo desse posicionamento encontramos nos seguintes precedentes dos Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul e do Maranhão:

CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA. LEI MUNICIPAL. EDIFICAÇÕES E LOTEAMENTOS. FALTA DE PARTICIPAÇÃO DE ENTIDADES COMUNITÁRIAS. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. É inconstitucional a Lei 1.365/99 do Município de Capão da Canoa, que estabeleceu normas acerca das edificações e dos loteamentos, alterando o plano diretor, porque não ocorreu a obrigatória participação das entidades comunitárias legalmente constituídas na definição do plano diretor e das diretrizes gerais de ocupação do território, conforme exige o art. 177, § 5.°, da CE/89. 2. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE.(TJRS. Ação Direta de Inconstitucionalidade 70005449053. j em 05 de abril de 2004. rel. DES. ARAKEN DE ASSIS)
(...) SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECLARANDO NULAS AS LEIS MUNICIPAIS Nºs.5389/2010 E 5.391/2010, QUE ALTERARAM A LEI Nº 3.253/1992, QUE DISPÕE SOBRE O ZONEAMENTO, PARCELAMENTO, USO E OCUPAÇÃO DO SOLO URBANO DO MUNICÍPIO DE SÃO LUIS, POR AUSÊNCIA DE ESTUDOS TÉCNICOS, DE PUBLICIDADE, DE TRANSPARÊNCIA E DE PARTICIPAÇÃO POPULAR EM SEUS PROCESSOS LEGISLATIVOS, RECONHECENDO INCIDENTALMENTE OFENSA À CF, E CONTRARIEDADE AO ESTATUTO DA CIDADE (LEI FEDERAL Nº 10.257/2001) E À LEI MUNICIPAL Nº 4.669/2006, QUE DISCIPLINA O PLANO DIRETOR DO MUNICÍPIO DE SÃO LUíS. LEIS DE EFEITOS CONCRETOS. (...) (TJMA. Mandado de Segurança nº 29167/2012 , Relator : Desembargador Jamil de Miranda Gedeon Neto, 05 de abril de 2013).

Diante desse e outros posicionamentos, o Conselho das Cidades editou a Resolução nº 25, de 18 de março de 2005, demonstrando os contornos de uma audiência pública. A propósito, veja-se:

Art. 4º No processo participativo de elaboração do plano diretor, a publicidade, determinada pelo inciso II, do § 4º do art. 40 do Estatuto da Cidade, deverá conter os seguintes requisitos:
I – ampla comunicação pública, em linguagem acessível, através dos meios de comunicação social de massa disponíveis;
II- ciência do cronograma e dos locais das reuniões, da apresentação dos estudos e propostas sobre o plano diretor com antecedência de no mínimo 15 dias;
III- publicação e divulgação dos resultados dos debates e das propostas adotadas nas diversas etapas do processo;
Art. 5º A organização do processo participativo deverá garantir a diversidade, nos seguintes termos:
I – realização dos debates por segmentos sociais, por temas e por divisões territoriais, tais como bairros, distritos, setores entre outros;
II -garantia da alternância dos locais de discussão.
Art. 6º O processo participativo de elaboração do plano diretor deve ser articulado e integrado ao processo participativo de elaboração do orçamento, bem como levar em conta as proposições oriundas de processos democráticos tais como conferências, congressos da cidade, fóruns e conselhos.
Art. 7º No processo participativo de elaboração do plano diretor a promoção das ações de sensibilização, mobilização e capacitação, devem ser voltadas, preferencialmente, para as lideranças comunitárias, movimentos sociais, profissionais especializados, entre outros atores sociais.
Art. 8º As audiências públicas determinadas pelo art. 40, § 4º, inciso I, do Estatuto da Cidade, no processo de elaboração de plano diretor, têm por finalidade informar, colher subsídios, debater, rever e analisar o conteúdo do Plano Diretor Participativo, e deve atender aos seguintes requisitos:
I – ser convocada por edital, anunciada pela imprensa local ou, na sua falta, utilizar os meios de comunicação de massa ao alcance da população local;
II – ocorrer em locais e horários acessíveis à maioria da população;
III – serem dirigidas pelo Poder Público Municipal, que após a exposição de todo o conteúdo, abrirá as discussões aos presentes;
IV – garantir a presença de todos os cidadãos e cidadãs, independente de comprovação de residência ou qualquer outra condição, que assinarão lista de presença;
V – serem gravadas e, ao final de cada uma, lavrada a respectiva ata, cujos conteúdos deverão ser apensados ao Projeto de Lei, compondo memorial do processo, inclusive na sua tramitação legislativa.
Art. 9º A audiência pública poderá ser convocada pela própria sociedade civil quando solicitada por no mínimo 1 % ( um por cento) dos eleitores do município.

Ora, se na elaboração do Plano Diretor deve se observar o princípio da ampla participação popular, este princípio não pode ser ignorado na alteração do mesmo Plano.
A simples observação dos precedentes jurisprudenciais citados e a Resolução do Conselho das Cidades patenteia o mais amplo descumprimento do Estatuto da Cidade e, como consequência, a inconstitucionalidade da Lei nº 4505/2018, que alterou o Plano Diretor, por malferimento do art. 24, I da Constituição Federal. A comprovada falta de participação popular torna nulo o processo legislativo e, por consequência a modificação do Plano Diretor, eivado que está de inconstitucionalidade material.
As revisões ou alterações do plano diretor devem observar o mesmo procedimento de sua elaboração (processo de planejamento participativo), além da ouvida de órgãos técnicos, como o COMPUR e o CODEMA.
Diz o Plano Diretor Participativo de Garanhuns (Lei nº 3.620/2008):

Art. 27. Por força deste Plano Diretor, compete ao Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente – CODEMA, além do que já define a Lei Municipal N° 3.394/2008 e Regimento Interno: (…)
II - opinar, previamente, sobre os aspectos das políticas, planos e programas governamentais que possam interferir na qualidade ambiental do município;

Consoante Atas de Reunião, pareceres e ofício 25/2018 desse órgão acostados,  isso não fora respeitado.

O Município afirma (ata da reunião do dia 03.12.2018) que a área afetada seria urbana de zona de transição (ZT) e que a mudança se daria para zona de alta densidade (ZAD). Acontece que a referida Lei cria Núcleo Urbano em área Rural, passando a caracterizá-lo como como ZAD, sem qualquer transição.
A propósito, o Plano Diretor Participativo de Garanhuns conceitua:

Art. 50. A Zona de Alta Densidade (ZAD) compreende as áreas das últimas fases de expansão urbana, predominantemente ocupadas por padrões médios e populares de parcelamento e edificação residencial. Consistem padrões urbanos que se proliferam, principalmente na sede municipal, com repercussões no modelo de expansão urbana das sedes dos demais distritos de São Pedro, Miracica e Iratama.
Parágrafo único. Constitui as ZAD parte dos bairros de São José, Boa Vista, Novo Heliópolis, Jardim Petrópolis, Parque Fênix, assim como os Conjuntos COHAB I, II e III, no distrito sede, além das áreas consolidadas de expansão dos núcleos dos distritos de São Pedro, Miracica e Iratama.
(…)
Art. 55. A Zona de Transição (ZT) compreende as áreas de ocupação ainda rarefeita, configurando-se como área de transição entre o urbano e o rural, predominantemente parceladas em grandes lotes ou glebas, com incidência de atividades industriais, de armazenagem e logística ou comércio atacadista.
Parágrafo único. Constitui a ZT parte dos bairros de Magano, Boa Vista, Severiano de Moraes Filho, Novo Heliópolis e Comunidade do Parque Fênix.
Note-se que tanto a ZAD e a ZT são pré-determinadas e que eventual mudança deve obedecer à regra geral da participação popular: as revisões ou alterações do plano diretor devem observar o mesmo procedimento de sua elaboração (processo de planejamento participativo), além da ouvida de órgãos técnicos, como o COMPUR e o CODEMA.
O Estatuto da Cidade (Lei Nacional n. 10.257/2001), no § 3º do seu artigo 30, determina que, pelo menos, a cada 10 (dez) anos, os planos diretores devem ser revistos.
Por meio da Resolução n. 83/2009, o Conselho Nacional das Cidades recomenda que os processos de revisão ou alteração do plano diretor sejam também participativos, cumprindo o disposto nos artigos 40 e 43 do Estatuto da Cidade e o conteúdo da Resolução n. 25 do Conselho Nacional das Cidades. Recomenda também que a revisão do plano diretor seja submetida ao Conselho da Cidade ou órgão similar da política urbana. E que a revisão em período inferior a 10 anos somente tenha início se for determinada por Lei Municipal.
Destaque-se ainda que a forma como tramitou o respectivo projeto de lei municipal, votado em regime de “urgência urgentíssima”, sem ouvir sequer a comunidade afetada pela mudança  - residente na área do Sítio Papa-Terra - feriu o princípio participativo que rege o Plano Diretor e violou também frontalmente A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE PERNAMBUCO, que estabelece:

CAPÍTULO III
DA POLÍTICA URBANA
Seção I
Do Desenvolvimento Urbano
Art. 144. A Política de desenvolvimento urbano será formulada e executada pelo Estado e Municípios, de acordo com as diretrizes fixadas em lei, visando a atender à função social do solo urbano, ao crescimento ordenado e harmônico das cidades e ao bem-estar dos seus habitantes.
§ 1º O exercício do direito de propriedade do solo atenderá a sua função social, quando condicionado às exigências fundamentais de ordenação da cidade.
§ 2º No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano o Estado e os Municípios deverão assegurar:
a) a criação de áreas de especial interesse urbanístico, social, ambiental, cultural, artístico, turístico e de utilização pública;
b) a distribuição mais equânime de empregos, renda, solo urbano, equipamentos infra-estruturais, bens e serviços produzidos pela economia urbana;
c) a utilização adequada do território e dos recursos naturais mediante o controle de implantação e de funcionamento, entre outros, de empreendimentos industriais, comerciais, habitacionais e institucionais;
d) a participação ativa das entidades civis e grupos sociais organizados, na elaboração e execução de planos, programas e projetos e na solução dos problemas que lhe sejam concernentes;
e) o amplo acesso da população às informações sobre desenvolvimento urbano e regional, projetos de infra-estrutura, de transporte, de localização industrial e sobre o Orçamento municipal e sua execução;
(...)

Por tudo isso, tratando-se do interesse fundamental da participação popular – premissa do regime democrático, que, conforme o artigo 127 da Constituição Federal, cabe ao Ministério Público defender -, estando explicitamente previsto em relação à legislação urbanística nas Constituições Federal e Estadual, no Estatuto das Cidades, no Plano Diretor Municipal e em Resoluções pertinentes, é que, independentemente de outras eventuais ações por atos de improbidade administrativa ou a crime ambiental, propõe-se esta ação civil pública com o b jetivo dedeclarar a nulidade da Lei Municipal nº 4.505/2018.


A propósito, o STF – Supremo Tribunal Federal -, no  julgamento do RECURSO EXTRAORDINÁRIO 607.940 DISTRITO FEDERAL, em 29/10/2015, aprovou tese com repercussão geral no sentido de que Os municípios com mais de vinte mil habitantes e o Distrito Federal podem legislar sobre programas e projetos específicos de ordenamento do espaço urbano por meio de leis que sejam compatíveis com as diretrizes fixadas no plano diretor”.

Vê-se que a decisão não ampara a Lei Municipal em tela, que, além de não observar as diretrizes do Plano Diretor, sobretudo o princípio participativo, vai muito além do propósito de estabelecer programa e projeto específico de ordenamento urbano, pretendendo, na verdade criar núcleos urbanos em área rural e modificar o zoneamento urbano, alterando o Plano Diretor e ignorando seus princípios.


DO PEDIDO
Ante as razões de fato e de Direito exaustivamente delineadas, o Ministério Público Estadual requer o julgamento procedente da demanda para:
- Declarar nula a Lei Municipal nº 4505/2018 e todos os atos que venham ser praticados sob sua égide.

DA CONCESSÃO DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA CAUTELAR

Segundo o novo CPC, as tutelas jurisdicionais provisórias, como o próprio nome diz, são tutelas jurisdicionais não definitivas, concedidas pelo Poder Judiciário em juízo de cognição sumária, que exigem, necessariamente, confirmação posterior, através de sentença, proferida mediante cognição exauriente.
Dentre elas, existe a tutela provisória de urgência, cujo tema é o que aqui nos interessa. E assim é denominada porque exige inadiável concessão do direito pleiteado.
Pelo texto do art. 300 do novo diploma legal, a tutela de urgência exige demonstração de probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Essa tutela de urgência ainda comporta mais duas divisões: (a) tutela provisória de urgência cautelar; e  (b) tutela provisória de urgência antecipada ou satisfativa.
No caso, cuidamos da tutela provisória de urgência cautelar.

In casu, vê-se claramente que toda e qualquer matéria referente à expansão urbana e seu zoneamento, deve ser analisada respeitando a participação popular e os órgãos técnicos, para que o desenvolvimento não ocorra de maneira desordenada, tornando clara a probabilidade do direito.
Tratando-se de lei de efeitos concretos, o perigo do dano neste caso funda-se na possibilidade de grandes prejuízos à sociedade, caso o Município possa continuar a executar suas atividades com base em um instrumento legal nulo, que ensejará loteamentos em desacordo com o Plano Diretor Participativo, com incalculáveis prejuízos ambientais e urbanísticos para as atuais e as futuras gerações, uma vez que sequer foram apresentados estudos técnicos sobre os impactos de tal mudança, nem ouvida a população diretamente e imediatamente afetada pela mudança.
Enfim, da lesão à ordem urbanística, podem decorrer os mais diversos prejuízos à sociedade, que suportará os já conhecidos problemas do crescimento sem a necessária ordenação, os necessários estudos e planejamento e sem a participação ativa da população no seu disciplinamento, o que contribui intensamente para o aumento dos custos de infraestrutura da cidade, danos ambientais e até mesmo a violência urbana, impulsionada pela ocupação desordenada.
Estão presentes os requisitos do art. 300 do Novo Código de Processo Civil relativos à tutela antecipada porquanto evidentes a “verossimilhança da alegação” caracterizada nos próprios fundamentos jurídicos desta inicial e “o fundado receio de dano irreparável” consubstanciado na lesão à ordem urbanística e os demais prejuízos subsequentes.
Não se nega a relevância da construção de moradias no Município de Garanhuns, em face do déficit habitacional. Todavia, a questão da moradia há de ser resolvida de forma compatível com as normas do planejamento urbanístico, da participação popular e da proteção do meio ambiente – do contrário, as condições de moradia e de vida da população tendem a se agravar.
Assim, em defesa do regime democrático expresso no princípio basilar da participação popular no planejamento urbano, entendido como instrumento essencial de garantia do bem-estar da população e de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, o Ministério Público, através desta 1ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania, atuando nas curadorias da habitação e urbanismo e do meio ambiente, na condição de substituto processual da coletividade requer, liminarmente, a concessão de tutela provisória de urgência cautelar, com fulcro nos arts. 12 e 21 da Lei nº 7.347/85, combinado com o art. 294 e seguintes do Novo Código de Processo Civil – NCPC – Lei 13.105/2015, nos seguintes termos:

1.     seja determinar ao Município e ao prefeito demandados   que se abstenham de aprovar ou efetuar o parcelamento do solo urbano, sob qualquer modalidade, bem como conceder alvarás de funcionamento e construção, até o julgamento final da lide, enfim, de praticar qualquer ato com base na Lei Municipal nº 4505/2018, sob pena de pagamento de multa diária do valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada um dos referidos demandados, em favor do fundo municipal do meio ambiente.
2.    seja determinado à Construtora demandada a paralisação de quaisquer procedimentos de desmembramento, loteamento ou edificação, enfim, de qualquer ato amparado na Lei  Municipal nº 4505/2018, ora impugnada, até o julgamento final da lide, ou, reconhecendo-se a procedência desta ação, até a sanção de Lei regularmente aprovada de acordo com o princípio participativo, nos termos expostos, sob pena de pagamento de multa diária do valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em favor do fundo municipal do meio ambiente.
3.    que se oficie ao cartório de imóveis competente para o registro das vedações provisórias de urgência cautelar ora pleiteadas.

Nestes termos, aguarda o Ministério Público a concessão da liminar ora requerida.
Na oportunidade requer ainda o Ministério Público que se digne Vossa Excelência em determinar:
1) A citação dos réus para, querendo, responderem aos termos desta ação e acompanhá-la até o final, sob pena das cominações aplicáveis,.
2) A produção de toda e qualquer modalidade de prova lícita e necessária;
Embora inestimável, dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por simples arbitramento.
Este feito é isento de custas e emolumentos a teor do art.18 da Lei n.º 7.347/85.
Nestes termos, pede deferimento.
Garanhuns, 10 de dezembro de 2018.

Domingos Sávio Pereira Agra
Promotor de Justiça
 Substituto automático

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