Excelentíssimo
Senhor Juiz de Direito
da VARA DA FAZENDA
PÚBLICA DA Comarca de GARANHUNS:
O
Ministério
Público do Estado de Pernambuco,
através de seu representante
na 2ª Promotoria
de Justiça de Defesa da Cidadania de Garanhuns,
na curadoria do Patrimônio
Público e Social, no uso das atribuições
previstas no art. 129, III, da Constituição
Federal, nos termos da Lei nº
7.347/85 (disciplina a ação civil pública), com
base
nos
documentos anexos, vem perante V. Exa., mui respeitosamente,
NA DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E SOCIAL E DO DIREITO SOCIAL AO TRANSPORTE
(ARTIGO 6º, DA CRFB, COM A REDAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 90/2015),
propor, pelas razões de fato e de direito adiante expostas:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DE
LIMINAR, EM FACE DE:
1. Município
de Garanhuns,
pessoa jurídica de direito público interno, representado pelo Exmo. Sr.
Prefeito ou pelo Exmo. Sr. Procurador do Município (artigo 75, III, do Código
de Processo Civil), com endereço na sede da Prefeitura Municipal, no Palácio
Celso Galvão, na Av. Santo Antônio, centro de Garanhuns;
2. Conselho Municipal de Trânsito e
Transporte – CMTT
– órgão autônomo e paritário de controle social, de caráter consultivo,
fiscalizador e deliberativo, vinculado (administrativamente) à Autarquia
Municipal de Segurança, Trânsito e Transporte de Garanhuns – AMSTT, nos termos
da Lei Municipal nº 3.493/2007, com a redação da Lei 3.987/2014, com endereço
na Rua Ernesto Dourado, 890, Heliópolis, Garanhuns;
3. Autarquia Municipal de Segurança,
Trânsito e Transporte de Garanhuns – AMSTT, pessoa jurídica de direito público interno, integrante da
administração indireta municipal, com endereço na Av. Irga, nº 100, Bairro Novo
Heliópolis, CEP 55297-256, representada pelo seu presidente Elielson Pereira;
4. Izaías Régis Neto, prefeito
de Garanhuns, empresário, nascido em 13/11/1954, branco, casado, natural de
Terezinha-PE, ensino médio completo, CPF 173.909.664-91, com endereço no Palácio Celso Galvão, Av. Santo Antônio, 126 –
Santo Antônio, Garanhuns, CEP: 55293-904.
5. Coletivos São Cristóvão Ltda., estabelecida à Rua Alagoas, nº 1000,
15º andar, Bairro Funcionários, Belo Horizonte/MG, CEP 30130-160, CNPJ nº
17.251.034/0001-51, representada pelo seu sócio-administrador, Sr. Heloísio
Lopes, brasileiro, casado, administrador de empresas, residente e domiciliado à
Rua Cardeal, nº 21, Condomínio Estância Serrana, Nova Lima, MG, CPR nº
043.602.496-91, RG nº M -1.993.708, SSP/MG, com endereço em Garanhuns na Rua XV
de Novembro, 69-1, bairro de São José, tendo como gerente local o Sr. Domingos
Coelho de Sá.
A Lei Federal nº
8.987/95 – a Lei das Concessões estabelece:
O contrato de Permissão nº 01/2012 (cópia anexa), celebrado
entre o Município e a empresa Coletivos São Cristóvão Ltda., em seu Capítulo
VII – Da Tarifa, estabelece:
Cláusula 24ª
Na fixação da tarifa, o Executivo levará em conta os custos unitários
da permissionária, apurados através da aplicação de índices e preços
unitários, sempre fundamentados em estudos técnicos elaborados pelo Órgão
Gestor da Prefeitura Municipal de Garanhuns para manter o equilíbrio
econômico e financeiro da permissão, tendo como base os coeficientes da
Planilha de Apropriação de Custos Operacionais constante no Edital de
Licitação e a proposta de preços da permissionária.”
|
A
preocupação fundamental no desenvolvimento destes dois documentos, ao longo
destes quatro anos de trabalho da equipe, foi dar total transparência à
forma de cálculo dos custos. Todos os itens de cálculo estão organizados
segundo fórmulas paramétricas claramente definidas, além de anexos com
explicações completas sobre os itens envolvidos. O novo modelo de cálculo da
remuneração pela prestação dos serviços (lucro) está exaustivamente demonstrado
nos Anexos do documento.
Ainda, visando permitir que
equipes técnicas das áreas de governo, assim como operadores do setor de
transporte e, ainda, de estudiosos do assunto possam realizar os cálculos, está
também publicada nesta página no site da ANTP a planilha Excel com todos os
itens disponíveis.
A aplicação do novo método
afetará tanto a realidade dos contratos existentes quanto aqueles que serão
celebrados no futuro.” (Sublinhamos).
Art. 91. É proibido o uso de
inscrição de caráter publicitário nos pára-brisas e em toda a extensão da parte
traseira da carroçaria dos veículos, salvo no caso previsto no § 1º deste
artigo. (Redação dada pelo
Decreto nº 1.683, de 25.10.1995)
§ 1º Para efeito de
redução de tarifa, o poder concedente poderá disciplinar a utilização de
publicidade nos veículos de transporte coletivo de passageiros. (Incluído pelo
Decreto nº 1.683, de 25.10.1995)
§ 2º Não se configuram como
publicidade as inscrições de marca, logotipo, razão social ou nome do
fabricante, do proprietário do veículo ou da carga, nem as inscrições de
advertência e indicação do combustível utilizado.(Incluído pelo
Decreto nº 1.683, de 25.10.1995).
Ou seja: cabe ao governo
municipal disciplinar a publicidade nos ônibus e levá-la em conta para redução
da tarifa.
E entendemos que não é lícito
à empresa concessionária omitir essa receita na proposta de reajuste da tarifa;
receita, aliás, sobre a qual a jurisprudência tem até negado a cobrança de
imposto sobre serviços (dentre outras decisões: Tribunal de Justiça de Minas
Gerais TJ-MG - Ap Cível/Reex Necessário : AC 2038676-25.2010.8.13.0024 MG).
Além de plenamente em vigor o
dispositivo do Regulamento Nacional de Trânsito acima transcrito, tramita na
Câmara dos Deputados o projeto de Lei nº 3314/201, que “dispõe sobre os
recursos dos espaços para publicidade nos sistemas de transporte rodoviário,
ferroviário, metroviário e aquaviário de passageiros”, cuja justificativa
consideramos pertinente aqui transcrever, pela sua clareza e concisão
(disponível em
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=364F94413F16A6C1A53470947184B0AE.proposicoesWebExterno1?codteor=1400293&filename=PL+3314/2015):
“O movimento de pessoas nos
veículos e edificações dos sistemas de transporte rodoviário, ferroviário e
metroviário torna esses espaços privilegiados para a divulgação de mensagens
publicitárias. Sua exploração comercial, contudo, ocorre sem que o respectivo
benefício financeiro seja revertido para os usuários na forma de redução
tarifária.
Nossa intenção é corrigir essa
distorção, obrigando o concessionário de transporte coletivo a apropriar o
montante obtido com a venda de espaços publicitários como receita operacional
não fixa, a ser considerada no cálculo do valor das tarifas.
As empresas de transportes
coletivos que exploram estes recursos não têm nenhum custo com estas exposições
midiáticas, apenas cedem o espaço. Todo o custo -papel, materiais,
equipamentos, colocação, manutenção e inserção e outros itens que podem ser
utilizados - são pagos totalmente pelas empresas que desejam fazer o anúncio.
Ou seja, não há custo para as companhias de transporte coletivo.
Nada mais justo que estes
recursos sejam revertidos na redução do valor das tarifas cobradas dos
usuários. Uma vez que eles são os mais expostos a este tipo de mídia e ficam o
tempo todo submetidos a esta poluição visual e sonora.
Estabelecemos, ainda, que as
receitas geradas pela venda de espaços publicitários em terminais, estações e
nos pontos de parada dos sistemas de transportes sejam utilizadas para
subsidiar as tarifas.”
Nesse item, ainda invocamos a
Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana
Art. 9o O regime econômico
e financeiro da concessão e o da permissão do serviço de transporte público
coletivo serão estabelecidos no respectivo edital de licitação, sendo a
tarifa de remuneração da prestação de serviço de transporte público coletivo
resultante do processo licitatório da outorga do poder público.
§ 1o A tarifa de
remuneração da prestação do serviço de transporte público coletivo deverá ser
constituída pelo preço público cobrado do usuário pelos serviços somado à
receita oriunda de outras fontes de custeio, de forma a cobrir os reais
custos do serviço prestado ao usuário por operador público ou privado, além
da remuneração do prestador.
|
O Parecer do CAT-Contábil, em
anexo, confirma que não há referência à receita de publicidade na proposta de
reajuste da tarifa feita pela empresa concessionária de Garanhuns.
“Art. 6o Toda concessão ou permissão pressupõe a
prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme
estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1o Serviço adequado é o que satisfaz as condições
de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade,
cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.”
Ainda que se entenda que o
serviço do particular, concessionário, tem um custo que deve ser ressarcido e
ser legítima a pretensão de lucro razoável, deve ser observada, por outro lado,
a capacidade de pagamento dos usuários, especialmente em se tratando de direito
fundamental de locomoção.
Segundo nos ensina Celso
Antônio Bandeira de Mello (2010, p. 676), as tarifas devem ser módicas,
impedindo, assim, sua excessiva oneração, de modo assegurar que seja acessível
a todos os usuários, uma vez que “o serviço público, por definição, corresponde
à satisfação de uma necessidade ou conveniência básica dos membros da
Sociedade”.
Embora não haja vinculação
entre os custos do serviço de transporte coletivo e os índices de renda dos
usuários, estes não podem ser desprezados na fixação da tarifa, sob pena de
negarmos o direito a uma tarifa módica (do latim “modicu” - exígua, pequena) e impedirmos o acesso ao
serviço por parte de larga faixa da população que dele necessita.
Conforme parecer do centro de
apoio técnico contábil em anexo, o reajuste aprovado pelo CMTT e autorizado
pelo decreto municipal representa um percentual de 11,54%, considerada a tarifa
em dinheiro (R$ 2,90) e de 7,14%, considerando-se a tarifa com cartão (R$
2,80), enquanto que o reajuste do salário-mínimo previsto para 2019 é de apenas
4,33% e a previsão de inflação para todo o ano de 2018 é de 4% - o que
demonstra uma grande desproporção, provocando claros prejuízos para o usuário
do transporte coletivo em Garanhuns.
Atente-se, conforme o mesmo
levantamento do CAT-Contábil, que, segundo dados do IBGE (http://www.cidades.ibge.gov.br),
em 2016 o salário médio dos trabalhadores formais em Garanhuns era de
1,8 salários-mínimos, e 43,8% da população tinha uma renda per capita de
meio salário-mínimo.
E é sabido que muitos
trabalhadores precisam de dois ônibus para ir ao trabalho, em face muitas vezes
residirem distante e não disporem de linhas únicas que percorram todo o
percurso, sendo obrigados a pagar duas passagens apenas na ida.
Uma passagem de R$ 2,90, como
a autorizada pelo decreto municipal, representa, no mínimo, R$ 5,80 por
dia, e R$ 174,00 por mês, o que equivale a 17,4% do salário-mínimo previsto
para 2019, valor que não pode ser considerado módico, ainda mais, como visto
acima, quando o último cálculo da renda per capita da população local é
de meio salário-mínimo.
Dessa forma, mantido o aumento
da passagem autorizado pelo decreto municipal, os gastos com o transporte
coletivo em Garanhuns representará exorbitante percentual em relação aos
rendimentos dos trabalhadores formais ou informais de Garanhuns.
Some-se a tudo isso o atual
elevado nível de desemprego, reforçando a necessidade da modicidade da tarifa,
para que não se exclua ainda mais da cidadania essa parcela da população.
Nesse contexto, é que a
Justiça tem entendido que o reajuste da passagem de ônibus pode ser
condicionado ao índice da inflação (“https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/noticia/justica-autoriza-reajuste-de-tarifa-de-onibus-com-base-na-inflacao-em-santos-sp.ghtml”).
No mesmo sentido, esta outra
decisão abaixo transcrita:
AGRAVO DE
INSTRUMENTO – DEFERIMENTO PARCIAL DE LIMINAR EM MEDIDA CAUTELAR ANTECEDENTE
DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA – REAJUSTE TARIFÁRIO DO TRANSPORTE PÚBLICO URBANO DE
SANTOS. Decisão que deferiu, em parte, o pedido de tutela antecipada, a
fim de suspender, até o deslinde do feito subjacente, o reajuste da tarifa do
transporte público urbano, no que exceder o índice de 6,29%, correspondente
ao IPCA de 2016, de modo a permitir que a tarifa seja reajustada em R$
0,20, passando, assim, de R$ 3,25 para R$ 3,45. Insurgência da Defensoria
Pública-autora. Descabimento. Perigo de irreversibilidade dos efeitos da
decisão. Inteligência do art. 300, § 3º, do NCPC. Precedentes. Decisão
mantida, no que toca à parte relativa ao não deferimento da medida liminar.
Recurso desprovido.
(TJSP; Agravo de Instrumento 2013631-84.2017.8.26.0000; Relator (a):Spoladore Dominguez; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Público; Foro de Santos -2ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 20/09/2017; Data de Registro: 21/09/2017) |
DO DEVER DE TRANSPARÊNCIA PELO MUNICÍPIO E PELA
CONCESSIONÁRIA
A Lei nº 12.587, de 3 de
janeiro de 2012, que institui as diretrizes
da Política Nacional de Mobilidade Urbana, estabelece:
A Lei nº 13.460, de 26/6/2017,
que “dispõe sobre participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos
serviços públicos da administração pública”, cuja vigência nos municípios com
mais de cem mil e menos de quinhentos mil habitantes inicia após quinhentos e
quarenta dias de sua publicação (que ocorreu em 27/6/2017), estabelece:
Art. 6o São direitos
básicos do usuário:
(…)
VI - obtenção de informações precisas e de fácil acesso
nos locais de prestação do serviço, assim como sua disponibilização na
internet, especialmente sobre:
(...)
e) valor das taxas e tarifas cobradas pela prestação dos
serviços, contendo informações para a compreensão exata da extensão do
serviço prestado.
|
Além da referida omissão da
receita com publicidade, não se verifica da parte do Município nem da
concessionária qualquer medida para publicizar amplamente, inclusive através de
suas páginas na internet, as informações relativas à composição das tarifas
cobradas, com os comprovantes pertinentes dos índices e custos utilizados para
os reajustes fixados – pelo que se impõe o dever de adoção das medidas necessárias
para ajustar-se à Lei 13.460/2017.
DO PEDIDO
Domingos
Sávio Pereira Agra
Promotor
de Justiça
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